Solidariedade a Juliana Reis, e o que é essa tal de “maternidade real”.

Não tenho facebook e quase sempre estou por fora ou atrasada quanto ao que viraliza pelas redes sociais. Aconteceu um tal do “Desafio da Maternidade”, em que as pessoas deveriam postar 3 fotos de momentos alegres e contentes da vida de mãe. Foi então que a polêmica começou quando Juliana Reis postou sua experiência real, cansativa e desgastante pra caralho em ser mãe. O post dela ganhou o mundo, muitas curtidas, algum apoio e, claro, infinitas repressões. O mais chocante foi o fato do perfil dela no Facebook ter sido denunciado e (pasmem) bloqueado. Assim seguimos, chocados, pela ignorância e babaquice do ser humano. 

(a noticia completa você encontra aqui).

desafio3

Frente ao horror, faz-se necessário demonstrar o meu apoio ao DESAFIO DA MATERNIDADE REAL:

(Juliana Reis, eu te dedico)

Faz quase 4 meses que sou mãe e ainda não terminei o luto de ter me perdido de mim mesma, de precisar me reinventar a cada dia, de ter outro corpo, dos meus vestidos mais queridos não me servirem mais. Não consigo, ainda, superar o fato do meu tempo não me pertencer e de não existir um espaço só meu. Aprendi a segurar o xixi por horas e horas e nem me lembro mais que tinha vontade de ir ao banheiro compulsivamente; quase não sinto fome ao longo do dia e só me dou conta de que não comi quando estou caindo de pressão baixa; amamentar dá uma sede absurda, mas nem sempre consigo segurar a garrafinha com uma mão segurando o bebê e ele segurando a outra. Aprendi a segurar um bebê enquanto ele mama e eu abro a porta quando a campainha toca, e a ir pra rua mesmo exausta e descabelada pois meu filho gosta de ver o movimento.

Muitas vezes durmo com uma criança me chutando a cara em seus movimentos involuntários de bebê. Quase nunca durmo mais de 3h seguidas e raramente posso tomar um bom banho – com direito a lavar os cabelos. Disso sinto mais falta: tomar banhos quando eu bem entender. Agora, espero o bebê dormir, espero ele estar muito concentrado. E os banhos são rápidos, de porta aberta e nada relaxantes. Também tomo banho com um bebê na cadeirinha em frente ao box, cantando pra ele enquanto me ensaboo – e tendo que sair correndo sem ter terminado quando ele começa a chorar. 

Demorei nove meses pra curtir uma gravidez que me fazia vomitar a alma, sentir sono, nenhuma vontade de levantar da cama, de sair de casa ou me divertir. Nove meses para filtrar todo tipo de comentário desnecessário e palpite idiota (que não vinha apenas de desconhecidos, mas da minha mamãe, madrinha, sogra, vizinha, primo, papagaio – daqueles que você ama e sabe que te amam também, mas que não entendem nada do que está se passando). Nove meses para sentir prazer com aquela enorme barriga desconfortável, onde não havia posição pra dormir ou força para caminhar dois metros. Aprendi a ver graça nela, a me encantar com os movimentos do bebê (e como se mexia o bichinho!), com as facilidades de te darem a preferência, de olharem com carinho. E quando, enfim, aprendi, o bebê nasceu e a barriga se foi. Vivo ainda o luto pela minha barriga e pelos olhares que antes eram para mim.

Um parto é uma experiência única, incrível, de muita força, coragem e blablabla, do qual eu continuei sentindo as dores por mais de mês. Mas o nascimento de uma criança não é só amor. O bebê é uma criatura estranha, que invade sua vida (se é que isso é possível, ainda mais intensamente do que quando na barriga). Há ali um serzinho enrugado que em nada parece com o que você sonhou e só faz te sugar. Literalmente te suga inteira. Que mama por horas e horas, que mama de hora em hora, que precisa de colo, aconchego e proteção. Há ali uma mãe que viveu infinitas horas de trabalho de parto, que está exausta, que está fraca, que perdeu litros e litros de sangue, que se sente feia e pressionada a demonstrar estonteante alegria por esse momento (que é uma grande confusão, na real). Mãe e bebê não se conhecem, não se entendem, o amor incondicional não é imediato, e ninguém conta essa parte da história.

E há o leite pingando por toda a casa, a roupa cheirando a leite azedo e toda molhada, e quando as pessoas dizem “Benza deus! Você tem tanto leite”, ter que concordar sorrindo. Só que ninguém sabe o quanto amamentar é difícil, e que não vem tão naturalmente assim. Não há situação mais “indigna”, mais degradante do que estar 24h por dia suja e fedida. A maternidade é um devir animal, urra-se no parto e deve-se ficar sem roupa, com o bebê em contato com sua pele, aprendendo a mamar quando ele quer. Mas ninguém te falou isso e ninguém permite que de fato assim seja. Te cobram “compostura”, que você não coloque os seis para fora em qualquer lugar, que ande bonita e cheirosa e que seu filho seja “bonzinho”, não chore.

Mas bebês choram simplesmente por serem bebês, por não entenderem o que se passa, esse mundão enorme, a diferença do claro e do escuro, a fome que os toma urgentemente, por sentirem cólicas todas as tardes. E o choro do bebê parte o coração, faz crescer uma angústia surreal, faz querer sair gritando, chorando também por não saber o que seu filho quer, não conseguir acalma-lo…

Não, eu não detesto ser mãe. Pelo menos, não completamente. Só um pouquinho. Apesar da cara de zumbi, estou me inventando outra. Apesar da saudade que sinto por quem eu era, gosto ainda mais dessa que me construo hoje e que reconstruo a cada dia. Compreendo todo a dor que há na maternidade. A sensação de se sentir sempre sozinha, mesmo quando há alguém que lave e passe pra você e te ajude com a faxina.  A solidão apesar do pai que não só ajuda, mas que participa de verdade. Porque a maternidade não é bolinho. É trabalho, desses pancadões mesmo. E deve ser questão de escolha.
Eu escolhi ser mãe.

(e a recompensa vem em cada sorriso do meu filho).

IMG_20160207_134530474 (1)

2 comentários sobre “Solidariedade a Juliana Reis, e o que é essa tal de “maternidade real”.

  1. Caroline disse:

    Confesso que é muito fácil falar “oown” para todas as fotos e risos do Nico sendo apenas a tia babona. Tenho orgulho da coragem de encarar esse desafio tão grande que é a maternidade. Só em pensar na ideia de um ser dentro de mim é assustadora, imagina a ideia de um ser que saiu de dentro de mim do lado fora agora?E ainda por cima, totalmente dependente de mim? A minha convivencia com meus 500 primos me deram um aperitivo de como essa vida de mãe é tensão total 24 horas por dia. Então desejo calma, paciência e muito amor todos dias, mamãe Juliana ( que apesar de todas as reinvenções sempre será Juzinha da cama ao lado, do andar de cima).

    Curtido por 1 pessoa

Deixe um comentário